22.9.05

Carta ao Pai

Ler o livro Carta ao Pai, de Franz Kafka dá uma outra dimensão à compreensão de sua obra e pensamento, no livro a intimidade do autor parece se desnudar sem que isso ocorra de forma vulgar ou desnecessária.Com precisão literária, digno de qualquer romance, Kafka escreve uma carta, que na verdade nunca foi entregue, cuja narrativa seria um acerto de contas com seu pai.Não é difícil verificar a influência que o pai teve na vida deste escritor, a força daquilo que Kafka considerava tirania e que certamente teve impacto crucial sobre sua personalidade.Interessante ver que, enquanto filho, Kafka observava aparentemente passivo mas com percepção aguçada as atitudes de seu pai, uma observação refinada e inteligente, mas de grande sofrimento.Através das críticas avassaladoras ao que Kafka considera desmandos do pai, constrói uma articulação de pensamento crítico e pesado, digno de um gênio, mas com a mágoa tão sentida, quase de um menino, que muitas vezes se iguala a de qualquer outra pessoa diante do amor não correspondido, expondo uma ferida aberta de anos e anos de revolta e no final, a força da indignação.Li O Processo antes de Carta ao Pai, hoje vejo todo o livro sob outro ângulo, nele percebo o quanto Kafka criticava quase a si mesmo, falando na verdade de uma auto recriminação diante da passividade frente a um oponente contra o qual não tinha força interna para lutar.Penso que, de alguma forma, no livro O Processo, ele estava falando de um sentimento que quase nunca conseguimos escapar, a culpa, só ela tem força para nos tornar algoz de nós mesmos, a ponto de não questionarmos nossas penas, nossas punições.Não é difícil perceber que todos estes ingredientes contidos no livro foram vividos na relação com um pai castrador que o impedia de se tornar um homem maduro para enfrentar a vida adulta (Kafka não conseguiu casar).É nítida a tristeza da falta de um referencial que ele pudesse considerar digno de ser imitado, com certeza o pai, amado e odiado ao mesmo tempo, não conseguiu ser uma referência masculina para ele, talvez por considerar sua tirania contraditória e sem sentido.A ambigüidade de sentimentos permeia toda a carta e vai se tornando quase um encontro com nossos próprios sentimentos diante do objeto amado quando não correspondido, a expectativa de algo que não foi como o esperado.Enfim, Carta ao Pai é um acerto de contas histórico que nos faz retornar aos nosso acertos parentais e individuais, ao questionamento de nossas relações primitivas e atuais.Kafka com sua mágoa particular nos faz refletir e entender um pouco mais sobre sua subjetividade e por conseqüência sua obra.Em uma simples carta pessoal, sem nenhum intuito literário, consegue ser genial, imortal e sempre atual.Um presente literário que enternece o coração, mas também inquieta.Fácil de ler, difícil de esquecer.

1.9.05

Politéia, Política, Putaria e Democracia

Por Nílbio Thé

Homossexuais, transexuais, bissexuais e travestis não se cansam de lutar pelos seus direitos civis (e por que não, os militares também?). E nem devem se cansar de fazê-lo, não é verdade? Afinal vivemos numa democracia, e numa democracia todos temos (ou deveríamos ter) direitos iguais, certo?

Não. Errado. Ao menos de acordo com Aristóteles.

Segundo Aristóteles existem basicamente três categorias “boas” de governo; a monarquia (onde só um governa tendo o poder concentrado em suas mãos), a aristocracia (onde poucas pessoas governam e um pequeno grupo de pessoas detém o poder político) e a politéia (o governo de muitos, onde muitas pessoas têm o poder político). São formas boas de governo porque não estão corrompidas, estão em seu estado, digamos, “puro”, livre da corrupção e da opressão. No entanto, ainda segundo o grego velho, todas as três formas político-administrativas podem sucumbir ante a ganância do poder. A partir daí, então, elas ganham novos nomes.

A monarquia em sua versão deturpada se transforma em tirania, já a aristocracia em oligarquia e, a politéia, pasmem, vira democracia, ou, a ditadura da maioria. Puxa vida... Mas logo com esse nome... Democracia!

Aristóteles não se enganou, posto que foi ele quem criou tais categorias. Nós é que nos enganamos por todo esse tempo. Ou alguém enganou a gente.

E pensar que ultimamente, nesse período fértil em que CPI’s e acusações florescem por todos os lados, escutamos vozes na tv e no rádio falando, como que com o orgulho ferido, que “sou democrata”, “vivemos numa democracia”, “nossa eleição foi importante para a consolidação do processo democrático” ou ainda nos filmes de um determinado país da América do norte: ”vivemos num país livre!” Qual a forma de governo lá mesmo? Ah!, é democracia também? Tá, deixa pra lá...

Mas o que eu ia falar mesmo é sobre a relação entre o sexo e a política. Mais precisamente, da opção sexual e suas conseqüências na versão negativa da politéia (parece até que estamos falando do mundo bizarro ou de algum monstro de anti-matéria!), ou seja, a democracia (será que evito essa palavra agora?). Vamos ver ser conseguimos deixar a prolixidade de lado e vamos direto ao ponto.

A democracia é a ditadura da maioria. E não uma forma política que dá voz a todo mundo. As pessoas no Brasil não sabem fazer política e, sobretudo, falar de política, um defeito tão grande quanto, quase. Quando alguém diz que devemos dar voz aos desfavorecidos porque são minoria e eles têm direito a ter voz pois vivemos numa democracia, estamos escutando, na verdade, uma balela idiota e sem tamanho. Ao menos segundo Aristóteles, Democracia é assim mesmo, é pau nas minorias.

Isso inclui grupos como os homossexuais, certos grupos religiosos e quem mais não possuir maioria numérica (claro, estamos simplificando um pouco as coisas). Será por isso que as minorias sofrem tanto para ter direitos reconhecidos? Os homossexuais de casar, os judeus e os adventistas do sétimo dia de terem o sábado respeitado como feriado ao invés do domingo, etc e tal.

Vivemos numa ditadura onde a maioria impõe as regras e oprime as minorias. E o pior é que crescemos achando isso certo, já que a vontade da maioria deve ser a conduta final, posto que é impossível agradar a gregos e troianos.

Mas partindo do pressuposto que mesmo salvaguardando os direitos das minorias nós não estaremos agradando a todos. Sempre haverão aqueles conservadores ferrenhos que querem impor sua vontade aos outros seres do planeta. Mas esse não é o verdadeiro sentido de se viver numa politéia.
Viver numa politéia, então, é mais “democrático” que numa democracia.

Irônico não? Talvez. Mas talvez também seja a solução para termos os direitos dos homossexuais, transgêneros e todas aquelas letras da nova sigla Gltb (Gays, Lésbicas, Transgêneros e Bissexuais –aliás, o termo “gay” serve para homens e mulheres, por que será que ainda tem o “lésbicas” na sigla?) garantidos.

Bom, enquanto ninguém faz anda (ou melhor, enquanto a maioria não faz nada) proponho, ao menos, instauração de uma nova palavra no vocabulário informal do brasileiro: a politéia! E aproveito para dizer: cuidado com essas pessoas que se dizem democráticas, as eleições estão chegando!

28.8.05

Momento de abstração reflexiva

Sinto-me mal por remover o texto da Patrícia da capa para justamente abordar a monotonia e a irrelevância de produzir a Esfera Pública como uma atividade solo, com raras contribuições de outros, tal como os textos da Karolyne e da Patrícia ou a autorização para publicação aqui dos textos do Maurício Santoro.

Estou nesse momento revendo a praxis no blog, em um movimento de abstração reflexiva sobre o projeto de revista, que lhe dá sentido. Estou estudando um bucado, mas um texto me chamou muita atenção, de fato me pareceu espécie de colírio alucinógino, não sei se em bom ou mau sentido, em todo caso, se tiver um tempinho, dá uma olhada no texto e me dia, mesmo que de forma curta, o que pensa sobre o que há escrito nele.

23.8.05

Preparação para o novo salto

A Esfera Pública está se preparando para um novo salto, desta vez um salto coletivo, que há de representar algo de bom na Internet ou, ao menos, na minha vida.

Quando o fale conosco fala

A Elenara publicou a íntegra de um fale conosco, o que merece algum destaque. Tá, não adianta todo mundo fazer isso, que nem tem graça, afinal todo mundo pode abrir seu próprio blog, mas hoje é dia de festa aqui na Esfera Pública.

Estou com o Gejfin

Palocci realmente se garantiu. Fez o que Lula não fez, mas já deveria ter feito, mas ainda não fez o que Duda Mendonça fez e que Lula já deveria ter feito também. Estou com o Gegfin.

Malvados sinistros

Os malvados hoje escondem algo de sinistro, ou de épico.

Patife

Fui Beretear e descobri a ótima sugestão do Tiago Casagrande, o site do Patife, embora tenha que reconhecer que seu texto vale a pena ser indicado por si . Então não deixe de conferir...

Google um Oráculo para a verdadeira Bíblia

A partir do comentário do jornalista Paulo Bicareto em seu Alfarrabio, faz-se necessário afirmar que não apenas o Google é um oráculo, como a web é hoje a grande materialização daquilo que pode ser considerado uma verdadeira Bíblia, inclusive por que deve conter versões eletrônicas da própria Biblia cristã. Fato é que certamente a web é a maior coleção de textos, comunicaçãos e imagens reunidas em toda a história da humanidade. É, sem sombra de dúvida, a verdadeira palavra de deus, estou certo de que o é inclusive na perspectiva de qualquer teólogo sério.

19.8.05

Percebendo o mundo a partir dos blogues alheios

O exército israelense está combatendo a resistência na Faixa de Gaza, após o encerramento do prazo legal para a saída de todos os colonos. A retirada dos colonos da Faixa de Gaza é, sem dúvida, um grande passo de Israel em direção à paz na região.

É um evento de grande importância para o mundo, talvez sem o espaço merecido no noticiário brasileiro, monopolizado pela crise política nacional. Além da política, o assalto à sede do Banco Central em Fortaleza disputa a atenção da população.

Os grandes temas acabam sendo abordados também por inúmeros blogues, o que nos permite ter acesso a diferentes opiniões, a diferentes metodologias de análise e também o acesso à expressão de observadores privilegiados, tais como jornalistas em plena Faixa de Gaza ou o Cristóvam Buarque.

Os blogues também permitem normalmente o comentário de seus leitores, o que traz ainda mais pluralidade na informação, uma vez que as informações e análises são avaliadas pelos leitores, que também trazem sua própria bagagem de informação e valores.

Uma dúvida resta, será que a percepeção dos leitores sobre a credibilidade dos blogues é diferenciada em relação a sua percepção sobre a credibilidade dos portais? Qual será essa diferença?

17.8.05

Heloísa Helena 2028

Há cerca de 20 anos o MDB representava a esperança, representava o futuro do Brasil, quando todas as apostas eram depositadas na "redemocratização". O MDB virou PMDB, que virou uma grande máquina eleitoral, um partido fisiologista.

É compreensivel que, tendo à frente um grande inimigo comum se aglutinem as mais diversas forças em uma oposição para o enfrentar e que, caído o inimigo o guarda-chuva perca sua carga ideológica e ocorra a desarticulação de suas forças.

Deve-se considerar também que MDB e Arena eram as únicas legendas permitidas durante a ditadura e, por conseguinte, as pequenas oligarquias municipais adotavam uma ou outra, quase aleatoriamente, para enfrentar seus inimigos locais, sem qualquer compromisso ideológico com a legenda nacional.

O PT também une sob seus guarda chuva um leque variado de forças, que também têm um inimigo comum, o político tradicional, as oligarquias que dominam o Estado. O PT nasce como alternativa ao fisiologismo no Brasil.

Constrói ao longo de 20 anos uma imagem fundada na ética, no compromisso com a democracia, com a honestidade e na participação popular para a admistração pública, representa a alternativa de mudança na forma de fazer política.

Lula então chega ao poder e, como uma sina, repete a história do líder polonês do Solidariedade, tão criticado pelo próprio PT e pelo próprio Lula. Chega ao poder através dos mesmos instrumentos que sempre criticou e condenou.

Faz política do mesmo jeito de sempre, chega ao poder como sempre, governa como sempre se governou, esquece a ética, a democracia, a honestidade e, principalmente, a participação popular. Opta, finalmente, pelo fisiologismo e pelo populismo.

O PT se esvazia 20 anos depois do PMDB se esvaziar, praticamente da mesma forma e provocando sentimento equivalente de frustração entre os brasileiros, que mais uma vez vêem suas esperanças de transformação se esvairem pelo ralo.

Agora, o PT também deve sofrer grandes perdas em seus quadros, assim como o PMDB. Ficam no partido os já assumidamente fisiológicos e aqueles que se vêem como dissidência, os quais lutaram entre si por mais 20 anos, assim como no PMDB até hoje.

Muito se fala no PSol como a nova alternativa, talvez com possibilidade de chegar ao poder também em 20 anos e o marco será a primeira mulher, nordestina tinhosa e destemida, a Maria Bonita do Parlamento.

Duvidaram do operário metalúrgico, migrante nordestino, que enfrentou ao mesmo tempo as corporações transnacionais e a ditadura. A ditadura se acabou, diz-se que por sua própria conta e erro, mas não se pode negar a importância do movimento operário.

As corporações transnacionais estão mais fortes e mais poderosas do que nunca, hoje os operários tem, provavelmente, menos força que tiveram na época que Lula era seu lider. É possível que os tempos sejam mesmo outros.

Lula é hoje símbolo de corrupção e está sendo julgado por aqueles que jamais conseguiu condenar pelos crimes que comete para chegar ao poder. Lula também se acabou e pode se dizer que também por sua própria conta e erro.

Antes se maldizia a morte de Tancredo, agora não se tem qualquer desculpa. Heloísa Helena daqui mais 20 anos?

16.8.05

O fascismo mora ao lado

O PT é tão útil ao establishment que é difícil acreditar que o governo Lula tenha terminado tal qual parece. Não que o PSDB não o seja, mas o PT tem, ou tinha, a vantagem de reforçar como nenhum outro partido a ilusão da democracia.

Há como se olhar para a toda a crise e encontrar uma grande vantagem com o otimismo de que se trata de um grande aprendizado coletivo, de maior envolvimento popular com a coisa pública, talvez até da descrença na representação.

A trajetória republicana do Brasil, entretanto, está repleta de ditaduras. Mal-sucedidas, que ao final prejudicaram a todos, inclusive às elites. Da última, herdamos o grande desafio da crise fiscal, necessária à manutenção do regime em seus últimos anos.

A grande possibilidade é que se encontre uma forma de contemporizar a situação, de amenizar o espetáculo e evitar uma crise de maiores proporções enquanto se minam as possibilidades de hegemonia do PT nas próximas eleições.

Um processo de impedimento tornaria Lula uma espécie de mártir, uma manobra arriscada, da qual se pode até vislumbrar o estabelecimento de um regime de fato, mas a questão é que o único nome forte é o próprio Lula, ainda capaz de aglutinar apoio popular.

Ainda há a recorrente e angustiante idolatria a Getúlio Vargas. Nenhum presidente foi tão noscivo às lutas populares e ao trabalhador quanto ele, mas parece que no Brasil todo político sonha em ser Getúlio, políticos de todos os naipes, talvez em busca de capitalizar o eleitorado fascista brasileiro, talvez até Lula.

É difícil creditar seriedade a qualquer possibilidade de golpe, apesar do recente aumento dos soldos depois da chantagem semi-declarada de reformados, que demonstrou fraqueza do governo. Sempre se reafirma a solidez das instituições democráticas.

Espera-se que as instituições democráticas sejam mais sólidas que o PT, até então um símbolo de sustentação dessas instituições, mas diante de tudo isso o que se pode fazer para garantir um futuro melhor para nossos filhos?

13.8.05


Viva os malvados! Perfeitos! Maravilhosos! Posted by Picasa

Lula versus Duda

Duda Mendonça é um homem de comunicação, um homem pragmático de comunicação, um homem brilhante, um excelente propagandista, alguém que não acredita na teoria da bala mágica da escola funcionalista clássica estadunidense.

A escola funcionalista é a base para a propaganda política contemporânea, que se iniciou com a perspectiva da bala mágica, que superestimava o poder da propaganda na guerra, considerando que a mensagem dos media seria absorvida pelas massas.

Lula é um político, também um homem pragmático da política, também um homem brilhante, mas é menos competente como propagandista que Duda, isso explica por que Lula só chegou à presidência quando contratou Duda. Lula, ao que parece, acredita na teoria hipodérmica, da escola de Frankfurt (Alemanha).

A teoria hipodérmica é, simplificando-se as coisas, similar à teoria da bala mágica, seu nome se deve à metáfora usada para explicar a ação da propaganda, que, também superestimando o poder dos media, acreditava na injeção subcutânea das mensagens, daí hipodérmica.

Duda quando se pronunciou à nação, uma vez que os depoimentos nas CPI estão sendo transmitidos ao vivo em cadeia nacional, sabia que não bastava falar qualquer coisa, nem para os deputados, nem para a população, era preciso falar algo crível e, para isso, teria que se comprometer severamente, dada a gravidade da crise.

De forma alguma se pode pressupor que Duda tenha falado a verdade, apenas a verdade e, principalmente, toda a verdade. Duda não nasceu ontem, certamente não entregou tudo, certamente apresentou uma narrativa favorável a si.

Duda fez o depoimento com base nos princípios que, provavelmente, sugeriria que o presidente também o fizesse, pois o que se destaca em seu pronunciamento é que ele parece falar a verdade, os congressistas demonstram acreditar naquelas verdades e a população levou para dentro de suas casas a sensação de que aquela era a verdade.

Lula, por outro lado, deixou de incluir em seu discurso, em seu mea culpa, os elementos necessários a transmitir credibilidade ao seu discurso, não se comprometeu em nada, esquivou-se de todas as acusações e não trouxe nada de novo.

Não falou nem ao povo, nem às elites, nem ao PT e nem ao Congresso. Lula em seu pronunciamento deveria falar ao povo, aos demais se entende que a informação é privilegiada, que têm canal especial, que avaliam a importância do pronunciamento em seu reflexo junto ao povo.

Talvez o presidente deveria ter usado o Câmara dos Deputados para fazer seu pronunciamento à nação, afinal o Congresso é a “casa do povo” e nesse momento, o povo está “dentro” do Congresso, ou é a sensação que possui com a TV Senado.

Se Lula recorresse hoje a Duda Mendonça, ou outro propagandista competente como é Duda, poderia estancar a crise, bastaria “imitar” Duda, falar ao povo de forma crível, ao povo que lhe daria sustentação para concluir o mandato e se reeleger até.

O Presidente da República, entretanto, joga o jogo que lhe é “sugerido” pela oposição, finge que sofre a ação de um golpe das elites brasileiras e trata o povo como massa amorfa, como se seus propagandistas ainda estivessem lendo os clássicos da literatura sobre mass media.

O governo Lula é bom para as elites, funciona como uma válvula que dá vazão à pressão por transformação e, portanto, evita uma “explosão”. As elites não desejam isso, embora provavelmente se sintam mais confortáveis com um FHC do que com um Lula, mas Lula está se comportando muito bem.

Embora a eventual queda de Lula enfraqueça o movimento organizado de esquerda, também mina as ilusões da população na democracia e isso abre muitos caminhos, nem todos felizes para as elites, o ideal para as elites seria manter a situação atual: crescimento econômico favorável e movimentos sociais em simbiose com o Estado.

A situação atual em muito remete a Getúlio Vargas, em especial à criação do Ministério do Trabalho, da Carteira de Trabálho, da vinculação dos sindicatos ao Estado, do controle de Estado sobre os movimentos operários, do esvaziamento do confronto a partir da militância chapa branca.

Quem também poderia ajudar Lula, talvez sem nem querer, é o PSol, que propõe a realização de um plebiscito para decidir a permanência ou não de Lula até o final do mandato, essa é a solução ideal, uma válvula típica do parlamentarismo, que debelaria a crise em uma saída ou em outra.

Se Lula adotasse o “conselho” de Duda, o plebiscito proveria a formalização do apoio popular conquistado, que seria conquistado através de um discurso crível, fundado na verdade, mesmo que não composto apenas pela verdade e nem contemplasse toda a verdade.

Se Lula continuar jogando o jogo da oposição as elites devem sim se inquietar com sua falta de habilidade para gerenciar a crise e devem pressionar para que renuncie, ou iniciar processo de impedimento do Presidente, solução que não agrada a quase ninguém.

Lula, talvez, nutra a expectativa secreta de se tornar um novo Getúlio, mas mesmo para isso, tem de aprender um pouco sobre propaganda com o Duda. É preciso lembrar que Getúlio usava o Rádio através de seu Departamento de Informação e Propaganda de maneira similar ao espírito nazi-fascista da Europa.

Lula não deve ser considerado fascista ou nazista, mas houve uma limpeza geral da lembrança da população sobre Getúlio, que hoje é venerado pelas mais diferentes correntes políticas brasileiras, é quase uma unanimidade, esqueceu-se quase todas as atrocidades, especialmente contra o operariado urbano, em seu governo.

Nota: O autor se recusa a utilizar o termo marketeiro, derivado da expressão tosca marketing político. O que Duda Mendonça faz é propaganda política, talvez uma forma renovada de propaganda, com maior profissionalismo que outrora no Brasil, mas é propaganda. A principal razão para a recusa do termo marketeiro é que, derivado de market, iguala política a mercado, cidadãos a consumidores.

12.8.05

Que democracia pode verdadeiramente transformar o status quo?

Plínio Sampaio, outrora um dos principais intelectuais do PT, afirmou ao Jornal da Cidade, de Bauru (SP), que "o Lula é mais benevolente com o sistema financeiro que o governo anterior", mas detacou que acredita numa diferença substancial.

Para ele há uma diferença de princípios, pois o governo FHC "acreditava nisso", enquanto o governo atual teme romper com o esquema existente e "criar uma situação que possa afetar o povo".

Plínio é candidato à presidência do PT pela Ação Popular Socialista, espécie de esquerda interna do PT, e defende a organização e a mobilização dos movimentos sociais a partir de suas convergências e não de suas divergências.

O candidato defende que o PT chegou ao governo, mas não ao poder e que o governo Lula é, na verdade, uma ilusão, um símbolo construído a partir de lutas verdadeiras, nascidas na década de 70, mas que abandona a organicidade popular para vencer às eleições.

Será possível o PT se reconstruir a partir do depoimento de hoje do propagandista ( resistência pessoal do autor ao termo 'marketeiro', que rejeita corroborar que política seja mercado) Duda Mendonça mesmo que seja eleito em setembro uma cúpula de esquerda?

Como firaria o governo Lula se fosse formada uma cúpula de esquerda em seu partido, principal partido da situação, uma vez que no Congresso a destruição dos quadros pelos erros do passado e do presente impressiona?

Plínio Sampaio tem, nesse momento, uma atitude quase heróica ao se candidatar à presidencia do PT, tamanha a ousadia de pensar reunir novamente a diversidade que formou o partido no passado e que foi esfacelada pela ditadura da maioria, o "Campo Majoritário" e a "Articulação".

Qualquer que seja o novo PT, ou que novo partido passe a representar os anseios dos trabalhadores e da povo brasileiro, é importante que se aprenda com os atuais erros do PT, não apenas com os síntomas, mas com suas verdadeiras origens.

Que democracia pode verdadeiramente transformar o status quo?

11.8.05

Depoimento do Duda Mendonça hoje!


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Rigor

A ânsia para tocar fogo na casa, para vingar a honra dos "políticos honestos" ou simplesmente para saciar o desejo da população por noticias quentes acaba por extremar a ausência de rigor no exercício profissional de jornalistas, de policiais, de parlamentares e certamente de outros profissionais.

Informações distorcidas grosseiramente, acusações apresentadas como fatos mesmo sem terem sido checadas, aproximações indevidas entre investigado e investigador e muito mais contribuem para uma imensa confusão sem perspectiva de solução.

Ao se observar um único dia em detalhes a crise política pode se perceber que não há outra saída senão que acabe em pizza, pois há muito estardalhaço e pouco fundamento e, mesmo, pouco rigor investigativo.

De um lado o inquérito no qual tomam parte deputados e senadores, que se armam do que é veiculado na imprensa, ao que é atribuído considerável valor de verdade. De outro a imprensa que se aproveita do que é dito em prenário enquanto afirmação oficial.

Suprimem-se alguns apostos na espiral da construção do discurso e especulações e acusações se transformam em fatos que se legitimam pela repetição e não pela comprovação, algo que lembra a constituição acionária das empresas do Chatô, em que uma era dona da outra em cascata até que a última era dona da primeira, finalizando uma estrutura circular.

A CPI pode até não acabar em pizza, mas a sensação para a população será, inevitavelmente essa, apesar da grande heroína, a TV Senado, pois o descuido e a falta de rigor profissional em quase todas as etapas dessa investigação, incluindo a mídia, estão valorizando demais testemunhos e indicios, quando será preciso provas documentais substanciais, que até o presente momento não aparecenram.

10.8.05

O poder ou o poderoso

Ficam declarados sujos todos os partidos do Brasil. Se algum ainda não é comprovadamente sujo, só pode ser por um motivo: é novo "ainda na caixa". Isso por um motivo simples: qualquer partido de qualquer lugar do mundo é sujo.

Roberto Jefferson, o grande trapalhão, está ensinando isso às nossas crianças, pois é evidente que o PT não sai inteiro da lama em que está atolado e, principalmente, não sai íntegro. Acontece que o PT funcionva como ilusão necessaria à manutenção da democracia representativa.

O PT era o elemento necessário à credibilidade das instituições. O PT caiu no mar de lama, o PT é um partido como todos os outros, não há partido honesto, não há político que trabalhe pelo interesse da nação.

A questão é que não é relevante derrubar o Lula, pois o próximo presidente fará a mesma coisa, independente de agir pessoalmente ou não, a única coisa que é certa é que tera aprendido com os governos anteriores, vai corromper e ser corrompido com precaução ampliada.

O parlamentarismo, nete caso, parece um elemento adequado à retomada da ilusão necessária que falta hoje à democracia. É certo que dissolver o congresso e convocar eleições gerais agora seria perfeito para renovar a esperança, seja ela vermelha, rosa ou da cor que for.

É certo, porém, que seria tanto quanto hoje, uma forma de renovar e manter a estrutura existente, aquilo que faz com que a corrupção se mantenha, que o tráfico de influência se mantenha, que o poder de quem manda seja exercido.

É difícil saber o que seria melhor ou pior para o Brasil, manter o presidencialismo e ir desgastando a democracia mais e mais a cada geração que chega às eleições, tentar uma solução parlamentarista, que debelaria de forma menos traumática crises como essa, que não se arrastariam indefinidamente.

José Dirceu, primeiro-ministro de fato, caiu, mas não caiu todo o ministério, não foi dissolvido o Congresso, então a crise é mantida em fogo alto, quando poderia ser colocada em fogo brando, fôssemos parlamentaristas.

Essa não é, contudo, a única reforma possível, há outras, algumas mais ousadas, outras menos, mas é preciso reformar, é preciso mudar a estrutura que favorece a corrupção e não apenas substituir os corrúptos.

Pode não haver fórmula perfeita, mas é preciso se diferenciar como um recurso para que se possa permanecer em repetição. É preciso mudar para renovar a ilusão, para renovar a esperança. É preciso acreditar que a corrupção possa diminuir.

9.8.05

Retomando a resistência

No Brasil, fortemente motivado pelas últimos escândalos, já se percebem manifestações públicas de absoluta descrença nessa democracia em que a população tão somente tem o direito de ratificar a decisão das elites hegemônicas.

Recentemente, uma senhora de classe média, administradora de uma pequena empresa familiar, admirava-se que em um ônibus, uma outra senhora, pobre, discursava para a platéia em trânsito sobre a importância dos brasileiros boicotarem as próximas eleições.

O desenrolar da democracia no Brasil não mostra os resultados esperados pela população. Nem no Brasil, nem no restante da América Latina. Após as ditaduras militares a população espera que as liberdades políticas e sociais e o respeito aos direitos humanos se concretizem e sejam acompanhados de redução na desigualdade social e econômica.

O que se assiste no Brasil é um faz-de-conta democrático, onde a população é desrespeitada impunemente pela classe política, pelo governo e pelas empresas, sem saber ao certo como se defender.

Não é tão diferente do que acontece no restante da América Latina, observada atentamente pelos vizinhos do Norte, que agora já não possuem o grande inimigo comum do comunismo, não há mais ninguém para comer criancinhas e o MST não assusta tanto as senhoras da pequena burguesia urbana.

O México, a Venezuéla, a Colômbia e a Bolívia vivem em constante tensão. São países em que existem grupos de resistência armados, preparados para a luta e, em alguns casos, cujos líderes contam com possibilidades reais de vencerem as próximas eleições, outros, como os Zapatistas, no México, propõe a reforma do sistema político de seu país.

Há cerca de meio século movimentos assim começavam a ganhar força na maioria dos países da América Latina, mas os Estados Unidos conseguiram agir pró-ativamente, como eles denominam a ação da CIA, e implantar ditaduras em quase todos os países, mas havia o grande inimigo que era o comunismo, que hoje não assusta mais nem criancinha.

O futuro promete...

Palestra sobre inclusão escolar e a experiência espanhola na Faced/UFC

O programa de pós-graduaçao em educaçao brasileira da Faculdade de Educação (Faced) da Universidade Federal do Ceará (UFC) promove dia 16 de agosto de 2005 a palestra "Inclusão escolar: práticas pedagógicas e formação de professores a partir do modelo espanhol" com o professor doutor Delfín Montero Centeno, professor titular do Departamento de Psicopedagogia da Universidade de Deusto, Bilbao, Espanha.

O professor Delfin, que é diretor do programa de pós-graduação em Educação Especial, audição e linguagem e coordenador do serviço de orientação universitária da Universidade de Deusto, vem à Fortaleza para participar do seminário "Pesquisa e Diversidade", que ocorrerá do dia 10 ao dia 17 de agosto na Faced/UFC e incluirá, além da palestra aberta ao público, debates sobre pesquisa e ensino com os participantes do Nudelec/Faced/UFC.

Dia 16 de agosto, às 14h30, no auditório da Biblioteca de Humanidades. A entrada é franca.

Para mais informações basta deixar um comentário.

8.8.05

Paradoxos do poder

A economia dos Estados Unidos vai bem, tão bem que a crise política do Brasil não tem efeito sobre a economia brasileira. Lula, um "inimigo" histórios dos Estados Unidos, não deve sofrer impeachment, muito menos renunciar e, muito provavelmente, deve ser reeleito, em grande parte graças aos efeitos prodigiosos do crescimento da economia daquele país.

Os Estados Unidos estão puxando o mundo todo, o Brasil meio que se arrasta, bem atrás de países como China e Índia, cujas economias têm crescimento consideravelmente maior que a do Brasil, mas um mundo em crescimento implica diretamente em mais consumo de petróleo, o que beneficia a Venezuela.

A punjança dos Estados Unidos cria um paradoxo, pois à frente da Venezuela está Hugo Cháves, o maior inimigo dos Estados Unidos depois de Fidel Castro, naturalmente se considerando o "lastro histórico" do ditador cubano, e grande "amigo" de Lula, assim como é Castro.

Chavez está aproveitando a alta do petróleo, cujo preço mundial é puxado para cima pela alta do consumo nos Estados Unidos, para extender sua influência política e econômica junto aos vizinhos. Está investindo na Argentina, no Equador e no Uruguai e acaba de subsidiar petróleo para países pobres do Caribe.

Após fracassar ao tentar derrubar Hugo Chavez na Venezuela, os governo dos Estados Unidos está concentrado em Evo Morales, líder indígena que pode se tornar presidente da Bolívia nas próximas eleições e que ampliaria o bloco hostil aos EUA e aliado a Chavez.

O Estados Unidos investem nas relações com a Colômbia e na luta contra as Forças Armadas Revolucionárias Colombianas, as Farc, e sua suposta simbiose com o tráfico de drogas internacional, mas as Farc podem se tornar aliados importantes da Bolívia caso ocorra lá fenômeno similar ao que ocorreu na Venezuela.

O Brasil se mantém no piloto automático, em velocidade de cruzeiro. Há estreitamento ideológico entre Hugo Chavez e Lula, mas Lula se mantém dentro da expectativa do mercado internacional. Essa conjuntura pode auxiliar o Brasil em sua pretendida liderança dos países da América Latina, pois mantém os diálogos possíveis com os vizinhos e com o resto do mundo.

Uma América Latina unida, por sua vez, enfraquece o poder dos Estados Unidos na região. O cachorro morde o próprio rabo. Os efeitos hegêmonicos da economia dos Estados Unidos sobre o mundo significam o principal sustentáculo de seu principal opositor em terras próximas. O petróleo torna Chavez muito mais perigoso que Fidel, é a diferença entre o poder do petróleo e o poder do discurso.

7.8.05

Laranja só é azeda enquanto está verde

Lula está limpo segundo a Polícia Federal e a Abin publica a Folha de São Paulo. A "operação pente-fino" não encontrou nada que ligasse o presidente aos escandalos que monopolizam os discursos brasileiros nas últimas semanas.

É certo que não se encontre nada, seria displicência primária envolver o presidente diretamente, assim como ao José Dirceu, não se conseguirá provar ligação direta de Lula ou de Dirceu em qualquer esquema ilegal.

Quando os escândalos vieram à tona davam à entender que os homens fortes do PT eram além de governo, irresponsáveis e burros. Talvez houve certa aposta exagerada na inexperiência dos petistas com o poder, aos poucos as nuvens mais negras vão se desfazendo.

Até o empréstimo do PT ao Lula, de R$ 29 mil, difícil de compreender de tão pífio, foi avaliado como um erro contábil do partido. Se é ou não verdade, isso jamais se saberá, mas que tem surgido questões que beiram o ridiculo, tais como as gráficas que comprometeriam Tarso Genro, isso tem.

Algumas dessas denuncias assustavam qualquer pessoa que tenha experiência em gestão financeira, tamanha a ingenuidade atribuida ao esquema, mas à medida que o tempo está passando, o que parece é que os homens de poder no PT e no governo estão formalmente limpos e que as coisas só estão azedas por que laranja verde é azeda mesmo, mas pode ficar bem docinha depois de madura.

Quartelada?

Estranhamente, José Alencar, vice-presidente e ministro da Defesa, dibulgou nota informando que o presidente Lula autorizou o reajuste de 23% na remuneração dos militares, apesar da nota divulgada pelo Clube Militar, que através de eufemismos praticamente ameaçava o governo de quartelada.

Alencar diz que a decisão "representa considerável esforço para atender às justas aspirações das Forças Armadas" mas a impressão que fica é a de que o governo foi chantageado e cedeu a essa chantagem.

Além disso, quanto é que essa crise vai custar ao final ao Brasil? Afinal se está discutindo um valor entre 50 e 200 milhões, não é pouco, mas 5 bilhões ao ano é muito mais!

Os gastos com a manutenção da estabilidade, a maior divisão do poder administrativo entre as bancadas que vão colaborar com a governabilidade no final do governo e todos os "agrados" que se farão necessários devem comprometer ainda mais a situação fiscal no Brasil.

Talvez seja o tempo de que se reveja a questão do presidencialismo no Brasil, pois sustentar essa estrutura pode estar saindo muito caro, talvez o parlamentarismo realmente possa oferecer soluções mais baratas para esse tipo de crise.

Afinal o primeiro-ministro de fato caiu, se fosse também de direito a questão da legitimidade do governo estaria resolvida, não seriam necessários todos esses acochambramentos que hoje se fazer necessarios.

Passos maiores que as pernas

Cristóvam Buarque se diz frustrado com a chegada do PT ao poder, pois "esperávamos, por exemplo, que com a vitória do Lula o Brasil tivesse um imenso orçamento participativo", admitindo certa ingenuidade, talvez fingindo ingenuidade.

Não é possível implantar orçamento participativo na união e da união transpor esse modelo para os estados e municípios, o movimento tem de ser o oposto, o orçamento participativo precisa se iniciar pelos municípios, depois pelos estados, para então chegar ao executivo federal.

O sonho do PT é bom, mas exige participação e não há como contar com participação em nível federal, quando essa participação não acontece em níveis estadual e muninicipal. A intenção é perfeita, mas exige um interlocutor ativo.

Para realizar o sonho verdadeiro do PT seria necessário que a subida do PT ao executivo federal tivesse se processado ainda de forma mais lenta do que foi e que nesse período mais municípios tivessem contado com a experiência do orçamento participativo e outras formas de fomento à cidadania.

A partir das experiência locais é que se poderia amadurecer um modelo para o executivo federal. Chegando à presidencia sem essa sustentação nos municípios o que se tem de sociedade civil a nível nacional é inexpressívo.

Talvez esse primeiro mandato do Lula tivesse como objetivo tão somente eleger prefeitos e governadores pelo Brasil e não realizar tão grandes transformações, apenas talvez.

O que se deve atentar nesse final de governo Lula é para a questão da austeridade fiscal, que é fundamental para que o Brasil possa evitar uma grande crise pós-mensalão, com consequência para algumas décadas de estrada esburacada.

6.8.05

Quem precisa de familia real?

A rainha dos baixinhos é mãe de uma das crianças mais famosas do Brasil, a Sasha, que talvez estréia como "cantora" ao lado da mãe na comemoração dos 20 anos do programa "Criança Esperança". Talvez a "princesa" não se apresente, pois segundo Xuxa, a menina é muito temperamental.

Temperamental é o mínimo que ela tem de ser, afinal, quem não ouviu na infância: "só quer ser o filho da Xuxa" em pé de igualdade com "se acha a última Coca-Cola do deserto" não estava no Brasil nem na década de 80, nem na década de 90.

A filha da Xuxa sabe que ela é a última Coca-cola do deserto, ela sabe que é uma princesa, é tratada como uma princesa e tem uma vida de princesa. Por que ela deveria cantar no Criança Esperança? Ela não é uma princesa?

A questão é compreender por que algumas nações precisam de uma família real, tal qual a Inglaterra. Há de se convir que estabelecer reis e rainhas, princepes e princesas conforme a conveniência é muito melhor.

A Sasha, por exemplo, é princesa hoje, por ser filha da Xuxa, mas ela não necessariamente se tornará rainha com a morte da Xuxa, sua majestade pode acabar junto com a vida da mãe. Não é certo, mas pode acontecer.

Na Inglaterra, no entanto, é absolutamente necessário tolerar um principe de Gales absolutamente sem graça, que não deixa de ser príncipe quando sua ex-mulher, mas veraddeiramente princesa morre.

Se principes e princesas, reis e rainhas são necessárias, que ao menos tenham carisma para tal. É possível imaginar o Edinho posando de príncipe? Claro que não, mas o Pelé se sustenta ainda como rei.

A renovação é fundamental. Símbolos são importantes, mas a herança genética não basta para que se componha um símbolo completo, é preciso mais e, infelizmente ou felizmente, parece não ser algo que se possa ensinar.

Enfim, talvez Sasha apenas pense que precisa ir para algum país distante aproveitar o dinheiro que a mãe acumulou, talvez nem pense nada ainda, talvez nem saiba que é estupidamente rica.

Só não diga "pobre da Sasha, nem pode ser criança à vontade", que pobre é a última coisa que ela é, ela é muito é rica, não tem nada de pobre, mesmo que para se fazer um omelete tenha que se quebrar alguns ovos.

5.8.05

Parabéns Brasil!

O Brasil está de parabéns, se não o Brasil, ao menos suas elites, pois suas instituições, supostamente do Brasil, suportam firmemente o furacão fluminense Roberto Jefferson (PTB), que já demonstra sinais de evidente desespero e destempero.

Não há como Roberto Jefferson escapar da cassação, é réu confesso e, o que é mais importante, perdeu o juízo. Talvez tenha percebido o estrago que fez a si mesmo e ao seu partido, mas parece tarde para consertar.

José Dirceu (PT-SP), que certamente tem culpa no cartório, retirou-se do cenário, concentrou-se bem em suas histórias, passou algumas horas defronte ao espelho ensaiando e se saiu muito bem em seu depoimento ao conselho de ética, até agora, tem apenas indícios contra si.

Jefferson não foi capaz de enfrentar Dirceu à altura, descontrolou-se, meteu novamente os pés pelas mãos e já teve que voltar atrás no que disse, já teve que reestruturar sua história, que talvez não estivesse pronta para ser usada no depoimento de Dirceu.

O erro de Jefferson foi subestimar Dirceu, embora seus talentos para os holofotes sejam irrefutáveis, Jefferson esqueceu que ser militante político em regime de excessão também traz suas experiências. Dentre outras coisas, ensina a manter o bico calado sobre o que não deve ser falado e faz isso de um jeito que cara feia nem assusta.

Jefferson deseja um acordo entre o PTB e o PT para que possa escapar ileso, ao menos para salvaguardar seu partido, mas é difícil o PT realizar tal acordo publicamente, seria, em se tratando de PT, uma emenda pior que o soneto. O PT tem de bolar uma solução muito boa, uma solução irrefutável.

Independente da solução, o PT sai manchado dessa história e sai do primeiro ano de mandato do Lula ainda mais próximo ao PSDB do que começou, ainda mais próximo das elitas que antes, ainda assim, talvez Lula tenha que disputar o segundo turno nas próximas eleições.

O presidente Lula se aproxima ainda mais do povo, ao menos enquanto houver holofotes sobre ele. O PT, com o médico das finanças à frente, aproxima-se mais das elites, é o caminho da sobrevivência para um governo em crise.

A elite não se incomoda que a Caixa Econômica Federal amplie os recursos para o financiamento da casa própria, além da pequena elite também aproveitar desses recursos, é muito melhor povo com endereço fixo, e muito mais fácil de vigiar.

O povo, o povo, é difícil saber o que o povo quer, o povo é muita gente, gente de todo tipo, que acredita em coisas diferentes. Até sabe que tem potencial para influenciar o governo, mas o que sabe mesmo, e não é de hoje, é que são as grandes corporações que têm a cinética para o fazer.

Além de tudo, algumas coisas são mais fáceis para o povo que para as elites, para o povo não é tão importante preservar as instituições, mesmo sem saber que elas só existem para sua própria opressão.

Para o povo os acusados já são culpados, mas pedindo desculpas, podem ser perdoados, afinal se envolver com prostitutas, mesmo as legendas, acaba dando nisso, acaba que todo mundo fica sabendo, acaba que dá a maior confusão, mas se o perdão parece sincero tem que perdoar, que todo mundo erra.

E a elite, as grandes corporações transnacionais, essas é que estão de parabéns, pois podem se orgulhar de ver toda essa panacéia de camarote, acompanhando tudo pelo celular de seus correspondentes no congresso, com quase nenhum risco de qualquer prejuízo maior.

Parabéns Brasil, já é um país grande, os grandes capitais podem confiar nessa terra, que mesmo em caso de tempestade seu dinheiro está seguro, pode-se investir que é lucro na certa, em momento de crise então, é lucro em dobro, pode especular que a nação é do bem.

Até MP do bem, a taça do mundo já é nossa, então, vem pra Caixa você também!

Gun control by Noam Chomsky

O blog da Esfera Pública disponibiliza para seus leitores e colaboradores um pequeno excerto do livro Secrets, lies and democracy, do Noam Chomsky, entrevistado por David Barsamian. A maior parte do livro é retirada das transcrições de entrevistas em meio radiofônico.

Pedimos desculpas aos leitores pelo texto exclusivamente em inglês, mas informamos que este texto serve muito mais de subsídio para artigos de nossos colaboradores e também para autores de blogs amigos, que estarão produzindo muito sobre a questão do desarmamento no Brasil, em decorrência da proximidade do plebiscito.

Abaixo o trecho denominado Gun control, páginas 35 a 38.

Advocates of free access to arms cite the Second Amendment. Do you believe that it permits unrestricted, uncontrolled possession of guns?

It's pretty clear that, taken literally, the Second Amendement doesn't permit people to have guns. But laws are never taken literally, including amendment to the Constitution ot constitutional rights. Laws permits what the tenor os the times interprets them as permitting.

But undelying the controversy over guns are some serious questions. There's a feeling in the country that people are under attack. I think they're misidentifying the source of the attack.

The government is the only power structure that's even partially accountable to the population, so naturally the business sectors want to make that the enemy - not the corporate system, which is totally unaccountable. After decades of intensive business propaganda, people fell that the government is some kind of enemy and that they have to defend themselves from it.

It's not that doesn't have it's justifications. The government is authoritarian and commonly hostile to much of the population. But it's partially - and pottentially vey influenciable - by the general population.

Many people who advocate keepting guns have fear of the government in the back of their minds. But that's a crazy response to a real problem.

Do the media foster the feeling people have that they're under attack?

At the deepest level, the media contribute to the sense that the government is the enemy, and they suppress the sources of real power is the society, which lie in te totalitarian institutions - the corporations, now international in scale - that control the economy and much of our social life. In fact, the corporations sei the conditions within which the government operates, and control it to a large extent.

The picture presented in the media is constant, day after day. People simply have no awareness of the system of power under which they are suffering. As a result - as intended - they turn their attention against the gonvernment.

People have all kinds of motivations for opposing gun control, but there's definitely a sector of the population that considers itself threatened by big forces, ranging from the Federal Reserve to the Council on Foreign Relations to big government to who knows what, and they're calling for guns to protect thenselves.

Radio listener: On the issue of gun control, I believe that the US is becoming much more like a Third World country, and nothing is necessarily going to put a stop on it. I look around and see a lot of Third World countries where, if the citizens had weapons, they wouldn't have the government they've got. So I think that may be people are being a little shortsighted in arguing for gun control and at the same time realizing that the government they-ve got is not exactly a benign one.

Your point illustrates exactly what I think is a major fallacy. The government is far from benign - that's true. On the other hand, it's at least partially accountable, and it can become as benign as we make it.

What's not benign (what's extremely harmful, in fact) is something you didn't mention - business power, which is highly concentrated and, by now, largely transnational. Business power is very far from benign and it's completely unanccountable. It's totalitariam system that has an enormous effect on our lives. It's also the main reason why government isn't benign.

As for guns being the way to respond to this, that's outlandish. First of all, this is not a weak Third World country. If people have pistols, the government have tanks, if people get tanks, the government has atomic weapons. There's no way to deal with these issues by violent force, even if you think that that's morally legitimate.

Guns in the hands of American citizens are not going to make the country more benign. They're going to make it more brutal, ruthless and destructive. So while one can recognize the motivations that lies behing some of the opposition to gun control, I think it's sadly misguided.

4.8.05

Você sabe chorar meu pai?

É certo que homem também chora há algum tempo, isso se sabe, mas e pai? Pai sabe chorar? Não há uma resposta fácil, ou melhor, até há: homem sabe chorar e pai é homem, logo, cartesianamente falando, pai também sabe chorar, mas e se forem deixados de lado os simplismos que nos acorrentam?

Em primeiro lugar teremos que ter consciência que pai nem sempre precisa ser homem, pai pode até ser mãe, pois também pode a mãe ser na verdade o pai. Basta os dois trocarem de lugar. Será que pode? Que pode, pode, pois acontece, se é certo trocar é que não é fácil saber.

Fácil é perceber que a presença mais contínua, tanto do pai, como da mãe, tanto dentro da família como junto à escola melhoram as oportunidades para o bom desenvolvimento dos filhos e das filhas, afinal são três cabeças pensando em vez de uma, então, sendo como for, não há crise, a família apenas se reelabora de forma equilibrada, cumpre seu papel.

É mesmo difícil encontrar a diferença tão grande entre pai e mãe para além de um sexismo arcaico uma vez que os filhos e as filhas parecem esperar hoje, tanto do pai quanto da mãe que lhes sejam referenciais enquanto profissionais e enquanto cidadãos, mas e enquanto pai ou mãe, o que esperam?

O que é certo que não dá é pai ou mãe tentar ou obrigar o outro ou a outra a ser pai e mãe ao mesmo tempo, isso não dá, pois são necessários os dois para que possam se tornar três. A criança precisa perceber dois referenciais para que possa se perceber enquanto uma pessoa, pois se há apenas um referencial, a criança há de pensar que é apenas continuação, seqüência daquele.

E será que precisa a criança olhar para pai e mãe ao mesmo tempo? Pode-se deduzir que seria mais fácil poder contrapor um e outro, mesmo tempo e mesmo espaço, mas às vezes isso não é possível, pois esposo e esposa, qualquer um dos dois, pode desistir da vida em comum por qualquer motivo, até sem motivo.

Isso não deveria implicar em que pai ou mãe se separasse do filho ou da filha, que continuam precisando de ambos, mas não vai poder mais contrapor um e outro simultaneamente, vai ter alternar.

Pai e mãe precisam aprender meios de cooperar em prol de um objetivo comum quando são desafiados a compartilhar a responsabilidade de criar uma criança e assim ensinam suas crianças como podem resolver conflitos de maneira saudável.

- Mas pai, você sabe ou não chorar?

Chorar. Saber chorar o pai sabia antes de ser pai, até ainda sabe, já que não é pai todo o tempo, às vezes é namorado e namorado que se preza sabe chorar, mas como pai é difícil, afinal aprendeu a ser pai com seu próprio pai, que não chorava, então pai não chora.

- Pai, mas quando eu for pai, eu quero poder chorar, e se doer?

Ser pai exige atenção concentrada e focalizada aos atos e aos sentimentos da criança. O pai precisa estar sensível a todas as emoções que traduzem a singularidade do filho ou da filha. Precisa viver o momento de ser pai entregue por inteiro, pois nada adianta a proximidade, se esta é tão somente física.

- Concentrada e focalizada nos sentimentos?

- Sensível a todas as emoções?

- Entregue por inteiro?

- Então como pode um pai não saber chorar?


- Pai que é pai, então, sabe chorar!

É verdade. Sentimentos, emoções e entrega são motivos de alegria e de riso, mas também de tristeza e de choro. O filho ou a filha precisa de um convívio autêntico com o pai, pois o não chorar pode ser percebido como o oposto ao amor, que é a indiferença. É o convívio verdadeiro que permite ao filho ou à filha o amor e a segurança do pai.

- Olha que legal pai, a gente também pode sorrir e ter lágrimas ao mesmo tempo!

3.8.05

Qual papel ainda se espera da Amélia?

A maternidade permanece um instrumento de opressão à mulher. Solteira, unida ou separada, a mãe é pressionada ao cuidado exclusivo dos filhos, mesmo não lhe sendo mais a única responsabilidade, pois essa mãe é ainda mulher, precisa estudar e trabalhar e será cobrada pelos próprios filhos quanto ao seu desempenho social e profissional.

Há um sempre maior número de pais buscando mais espaço na vida dos filhos, sabendo que a realização dos mesmos, como pessoa, depende da sua realização como pai, tanto quanto da mãe, mas a grande maioria dos casos é de descaso para com a mãe e para com os filhos.

Não é falta de saber cientifico, nem mesmo falta de leis adequadas, pois as constituições da maioria dos países, inclusive do Brasil, conferem ao homem e a mulher plena igualdade de direitos e deveres em relação ao cuidado dos filhos, mas a pressão se concentra exclusivamente sobre as mulheres.

No fundo, a sociedade ainda atribui à mãe certo misticismo, como se pela gravidez e pelo parto se tornasse um ser especial, o que à primeira vista parece benéfico à mulher, mas ao fundo esconde a legitimação para o caráter opressivo da maternidade, pois se é pela gravidez pelo parto que se adquiri a competência para o cuidar dos filhos, então é só a mulher que pode fazê-lo.

Ao homem é reservado o papel de prover, mero provedor, de utilidade limitada ao valor do que ganha, se não ganha nada então é de praticamente nenhuma serventia, mas a mulher não participa desse jogo à força, ela consente, pede por ele, pensa mesmo que precisa.

É o poder que se estabelece através da sedução, do desejo, espécie de elogio interesseiro, repleto de más intenções, pois a mulher ainda terá que viver plenamente sua vida, em compasso de igualdade com seu companheiro homem, mas terá que carregar sozinha a responsabilidade pelo cuidado dos filhos.

É certo que esse esforço se deve ao papel da família na modernidade. A família, que antes era a representação dos laços familiares, que se referia tão somente à consanguinidade e às questões de herança e sucessão, passou a ter um novo sentido, passou a ser responsável pelo disciplinamento e pelo cuidado dos corpos dos filhos para sua serventia futura.

Terão serventia nossos filhos de hoje na sociedade de amanhã? Ciborgues e robôs em geral são muito mais disciplinados e precisos que os seres humanos. Qual o perfil necessário para o sucesso no futuro?

2.8.05

Será mesmo qualquer bobagem Glória Maria?

Às vezes as nuances são mais que relevantes a uma determinada questão, ontem no Fantástico, a apresentadora Glória Maria apresentou uma tele-enquete sobre os "campos" de recuperação para homossexuais.

No momento em que foi anunciar a opção "não", o número que o tele-espectador deveria votar para dizer que não concordava com a existência de tais "campos de concentração", ela, fugindo ou não ao tele-prompter, complementou a resposta dizendo que o não englobava o fato de achar que a existência dos campos era "uma bobagem".

É uma nuance, mas é relevante, tal nuance me deu a certeza de que não ligaria para o sim ou para o não em hipótese alguma, posto que tais campos existirem não é apenas uma bobagem, é algo sério, relevante.

Pode-se dizer que não há de se obrigar ninguém a participar, então não há problemas, mas não são justamente o fundamentalistas cristãos os principais apoiadores de Bush?

Não são justamente esses mesmos eleitores que elegeram o congresso que exigiu dos países que recebessem ajuda dos fundos contra a Aids que discriminassem formalmente os profissionais do sexo?

O que lhes impede de, num momento em que se tornem ainda mais fortes no governo dos EUA do que já são hoje, exigir que os países em desenvolvimento determinem aos homossexuais contaminados submeter-se a tratamentos como esse para que possam receber tratamento para a Aids?

Alguém pode, inadvertidamente, acreditar que o que acontece nos Estados Unidos não é problema dos brasileiros, afinal os brasileiros já tem problemas demais com que se preocupar e que se não se aceita a legislação daquele país, basta se rejeitar a "ajuda oferecida" por eles.

Não é possível considerar tal questão política nos Estados Unidos como uma questão local, Washington é a nova Roma, a sede do império ocidental contemporâneo, o poder não está concentrado em uma única cidade, mas isso é mero sinal de que todos são capazes de aprender.

Tal ajuda não é simples ajuda, não é benevolência, pois que o mundo, quase todo, sustenta a sede do império, essa ajuda é um retorno mínimo, um gasto necessário para que se mantenha o império. Sem essas ações o império se tornaria muito mais perigoso.

O cristianismo está lá, nos Estados Unidos como no império romano, mas não é interessante voltar a Roma, pois que ela é demais distante de nosso tempo e já se cuidou devidamente de se desinfetar o imaginário ao seu respeito.

E o cristianismo de Roma é o cristianismo fundante de todo cristianismo contemporâneo, embora o brasileiro seja predominantemente católico e o dos Estados Unidos de algumas de suas discidências pós-reforma, mas essa mesma reforma era fundante da sociedade alemã.

E recentemente, há cerca de meio século, os homossexuais também iam a campos de concentração na Alemanha, onde usavam um triangulo rosa, dos quais eram diferenciados, por exemplo, dos judeus, que tinham de usar uma estrela amarela. (DOWNING, 2002, p. 195)

O triangulo rosa foi convertido em símbolo de resistência no final da década de 80 pelo grupo Aids Coalision to Unleash Power, mais conhecido como Act-up, formado em 1987. "Seu trabalho de maior alcance foi o triângulo rosa nazista impresso sobre um fundo escoro com os dizeres "Silêncio = Morte", que aparecia em cartazes, buttons, adesivos e camisetas." (id., ibid., p. 194-195)

Ao menos meio milhão de homossexuais foram exterminados, deliberadamente e exclusivamente por serem homossexuais, na Alemanha e países subjugados durante a primeira metade do século XX.

Tolerar ou até mesmo desejar a existência de campos de concentração, tal qual a enquete do Fantástico pode ser um indício no Brasil, incluindo a categorização da existência de tal campos como qualquer bobagem pelo próprio jornalismo da emissora, é se tornar cúmplice.

Grosso modo a única coisa que diferencia ao final a influência do cristianismo e do islamismo na politica é o ponto de vista, de quem vê ou é visto, simultâneidades nem sempre percebidas e muitas vezes ocultas na diversidade de temporalidades.

DOWNING, John D. H. "Mídia Radical: Rebeldia nas comunicações e movimentos sociais". Tradução Silvana Vieira. Editora Senac São Paulo. São Paulo, São Paulo. 2002.

1.8.05

Palestra sobre inclusão escolar e a experiência espanhola na Faced/UFC


ERRATA: A palestra foi transferida para o dia 16 de agosto!


O programa de pós-graduaçao em educaçao brasileira da Faculdade de Educação (Faced) da Universidade Federal do Ceará (UFC) promove dia 15 de agosto de 2005 a palestra "Inclusão escolar: práticas pedagógicas e formação de professores a partir do modelo espanhol" com o professor doutor Delfín Montero Centeno, professor titular do Departamento de Psicopedagogia da Universidade de Deusto, Bilbao, Espanha.

O professor Delfin, que é diretor do programa de pós-graduação em Educação Especial, audição e linguagem e coordenador do serviço de orientação universitária da Universidade de Deusto, vem à Fortaleza para participar do seminário "Pesquisa e Diversidade", que ocorrerá do dia 10 ao dia 17 de agosto na Faced/UFC e incluirá, além da palestra aberta ao público, debates sobre pesquisa e ensino com os participantes do Nudelec/Faced/UFC.

Dia 15 de agosto, às 14h30, no auditório da Bibioteca de Humanidades. A entrada é franca.

Para mais informações basta deixar um comentário.

O que podem nos dizer "O aprendiz" e "O grande perdedor"?

Para ganhar bem, segundo as consultorias de recolocação de executivos, é preciso ser homem, alto, magro, vestir-se bem, frequentar academia de ginástica regularmente e, principalmente, que não ter tatuagens ou piercings visíveis.

Pode-se buscar explicações as mais diversas, mas o importante é que essas orientações são elaboradas a partir de pesquisas realizadas com os empregados e os empregadores que compõe o mercado nacional, ou seja, são orientações baseadas na moda entre os empregados que recebem os melhores salários no Brasil.

Os reality shows, de certa forma, espelham essa realidade, todos, mas para facilitar a análise parece conveniente se concentrar no recém-encerrado "O Grande Perdedor" e no atualmente em cartaz "O Aprendiz 2".

O Grande perdedor é um programa de conversão de gordos, que devem se tornar magros para ganhar, é o que realmente importa, perder peso corporal em comparação com os demais e, talvez por ser conduzido pelo Silvio Santos, não sem um bucado de humilhação.

Já O aprendiz, que é conduzido pelo Roberto Justus, tem um carácter menor de humilhação do indivíduo, talvez mais por conta do estilo da produção que do argumento do programa, talvez, mas não é negável que as personagens de O aprendiz são o oposto das personagens de O grande perdedor.

As personagens de O Aprenziz estão sempre bem vestidas, bem apresentadas, talvez exatamente dentro da perspectiva que as consultorias de recolocação profissional traçam como o candidato ideal.

De um lado pode se observar a imagem do fracasso, que aceita o escárnio e humilhação públicos, de quem para vencer tem de se tornar menos pior que era em comparação com os demais, do outro a imagem do sucesso, que tenta se mostrar melhor que os demais em todos os aspéctos.

É a diferença que segrega, mas não apenas na TV, no quotidiano, quando não se atende ao modelo se está condenado a um posicionamento secundário, tal qual refletido nas pesquisas sobre renda de executivos, estes estão sempre mais dentro das normas que o resto da amostra.

E não é somente uma questão de peso, há inúmeras outras diferenças, sejam estéticas, sejam ideológicas, seja de sexo ou de sexualidade, seja de crenças, afinal não se formam as pessoas para valorizarem as diferenças.

O que será essa tal de educação para a diversidade?

31.7.05

Qual sua vocação?

E curioso o que pode acontecer se ao lhe perguntarem o que você faz, você responder que não tem uma profissão e que não trabalha, que também não é um estudante em sentido estrito e que seus pais não são ricos, mesmo que essa conversa se dê através de um bate-papo na Internet com pessoas que você jamais viu e provavelmente jamais verá novamente.

Rapidamente se forma uma manifestação do corpo social do bate-papo, como se fossem anti-corpos atacando a um micróbio, primeiro numa busca frenética de conversão da ovelha desgarrada à ética do trabalho e depois em um esforço dissimulado para afastar o inímigo comum, que de vagabundo passa num instante a delinquente.

É impressionante como está cristalizada a idéia que para existir é necessário se submeter ao trabalho, de forma que ou se é patrão, ou se é empregado, ou se é profissional liberal, mas é preciso se ter uma profissão.

Se não se nasce rico para se ser dono, então sendo dono de seu corpo é única opção arrendar-lhe aos que precisam dele para a produção, claro que há as pessoas que passam de uma função a outra, essas cumprem a função especial de legitimar o sistema.

Não é permitido se ser dono simplesmente do próprio corpo, sem lhe arrendar a quem dele precisa, mesmo que esse alguém queira lhe pagar muito menos que seu corpo vale, só por que há outros tantos corpos disponíveis, não é permitido que se usufrua do próprio corpo em benefício próprio.

Deve ser por isso que não se pode matar a si mesmo, que não se pode maltratar o próprio corpo, pois o corpo deve estar em bom estado para que seja produtivo. Deve ser por isso que não se permite fazer usos indevidos do corpo, por deve permanecer dígno de uso.

Foi com a invenção do fuzil que o corpo ficou importante? Houve algum momento em que quase não tinha valor, mas com a invenção do fuzil, o custo de um soldado aumentou muito, uma vez que não era tão simples manejar o fúzil quanto era a lança ou a espada, sendo assim não se podiam disperdiçar corpos como antes, pois mesmo que fossem baratos, demoravam a manejar o fuzil com habilidade.

Por que o corpo é ainda importante? Por que não se permite que se faça ao próprio corpo o que se deseja? Por que para se existir há de se exercer uma profissão? E se os impérios contemporâneos caissem como caiu o Império Romano no passado e uma nova "Idade Média" se instaurasse o que você faria?

30.7.05

Lula não cai, pode até balançar, mas não cai

A maioria dos brasileiros não tem consciência da diferença entre o conceito de democracia para os brasileiros e para os estadunidenses. Sempre se pensa que uma palavra com uma mesma etimologia e significado em sentido lato remete à mesma idéia em qualquer lugar e em qualquer tempo, mas esse não é o caso.

Para Chomsky (1989), democratizar a mídia representa duas idéias diferentes, baseadas em diferentes conceitos de democracia, para brasileiros e para estadunidenses:

"For then [brazilian bishops], democracy means that citizens should have the oportunity to inform thenselves, to take part in inquiry and dicussion and policy information, and to advance their programs through political action. For us [at USA] democracy is more narrowly conceived: the citizen is a consumer, an observer but not a participant. The public has the right to ratify policies that originated elsewhere, but if the limits are exceeded, we have not a democracy, but a 'crises of democracy', which must somehow be resolved."

Ou seja, conceituralmente no Brasil se compreende democracia como a participação na definição de políticas e do governo em si e nos Estados Unidos a democracia é compreendida como um instrumento de ratificação do eleitorado a políticas previamente definida pelas elites.

O que conduz ambos os povos a percepções tão diferentes sobre uma mesma palavra na visão de Chomsky não pode ser objeto deste texto, em primeiro lugar pela patente falta de preparo deste autor e também por que mais que se ligar à origem do fenômeno é objetivo aqui destacar as relações entre essa percepção diferenciada e a atual crise política brasileira.

Apesar das diferenças de percepção a prática democrática nos dois países não é tão divergente, é por demais similar, embora seja difícil comparar a participação do eleitorado no Brasil, cuja legalidade democrática foi limitada por inúmeros golpes de Estado que estabeleceram longos períodos de excessão ao longo de pouco mais de um século de república em comparação com a estabilidade legal da instituição republicana nos Estados Unidos.

O eleitorado brasileiro não participa, seja diretamente ou seja por representação, na definição de políticas ou nas ações do governo, mas acredita que deveria participar, que está em falta para com a nação e que a nação está em falta para com ele, uma dissonância entre teoria e prática, que acaba por levar à prova constante das instituições.

A elite brasileira, que vive entre o desejo dos resultados da economia dos EUA e o requinte e a sofisticação européias, sabe muito bem que o que lhes interessa é o conceito de democracia ali vigente, embora não saiba exercer com a competência necessária o modelo de propaganda da elite daquele país.

Para o brasileiro, povo ou elite, a crise política é previsível e, por isso, não choca. O eleitorado têm consciência que os políticos não os representam e que utilizam a máquina estatal em seu próprio benefício. A população convive com a corrupção política no município, sempre há alguém na comunidade que até participa de um ou outro esquema.

A população sabe que o sistema é podre, mas está de certa forma tão comprometida com o sistema, uma vez que nas cidades pequenas do interior todo mundo quando não é primo, é vizinho, que não se vislumbra uma alternativa plausível.

De um lado o executivo federal está distante do eleitorado, não é percebido enquanto uma continuidade do poder local e de fato não o é, então Lula aparece convicente na TV, ao mesmo tempo moderado e bonito, um grande símbolo da luta pela democracia e um herói do povo. O poder local não tem como neutralizar sua eleição.

Do outro, os deputados federais, embora também estejam distantes da população, são anônimos, não são grandes heróis, talvez por isso a escolha do eleitor possua um vínculo mais forte com o poder local.

O poder local estabelecido, no município ou no bairro, tem mais força para eleger os deputados de seu interesse que para eleger o presidente de seu interesse, pois o deputado é apresentado como amigo do município e não como representante de um determinado pensamento e é como amigo do município ou do bairro, da comunidade ou da igreja que a maioria dos deputados são eleitos.

O eleitorado tem dificuldade de reconhecer o partido, de perceber o que uma sigla ou outra significam e, se a nível nacional existe alguma noção de partido, a nível local, municipal, os partidos servem de legenda momentânea às famílias tradicionais, à elite local.

Talvez um reflexo dos suscessivos períodos de excessão vivenciados no Brasil, os partidos brasileiros são frágeis, são instituições novas, o PT, partido do Presidente da República, está comemorando 25 anos, ou seja, o partido do governo é mais jovem que a maioria dos eleitores.

O grande problema do PT para o establishment é que seu discurso é o de aproximar o exercício democrático da percepção de democracia no Brasil e nos municípios menores as administrações petistas acabam por instituir práticas como o orçamento participativo com sucesso, o que não interessa aos poderes estabelecidos.

Para as elites o Lula na presidência não atrapalha, mas deixar que o PT se fortaleça com o Lula pode criar a idéia de que votar no PT é votar no Lula, de que votar no candidato do PT no município é conferir mais poder ao Lula, então a elite teme que que se o PT governar mais municípios, vai haver mais gente acreditando que pode participar do governo e isso é um risco verdadeiro para as elites.

É por isso que é necessário enfraquecer o PT, encabular o militante local, aquele que acreditava na idoneidade do partido, que atribuia ao partido a mesma honestidade que a si próprio, que não vai ter mais a mesma garra na próxima eleição, assim o PT pode até levar alguns governos de estado, até o presidente mas não leva muitos deputados estaduais ou federais na próxima eleição, que seriam oficiais importantes para as pequenas batalhas municipais das eleições de 2008, quando o plano petista realmente poderia ser considerado consolidado.

O Lula então não cai, mas o projeto petista para o Brasil se esfacela em 2005, para o PT chegar à presidência sem construir uma base de sustentação foi a emenda que destruiu o soneto. O PT conseguiu manter os anéis e perder os dedos, pois sai com seu símbolo maior quase intácto, mas com seu corpo esfacelado.


CHOMSKY, Noam. Necessary Illusions: Thought control in democratic societies. South End Press. Boston, MA. 1989.

29.7.05

Criança Esperança: indulgências e missionários

Há certa perversidade em se debater algo como o programa Criança Esperança, uma parceria entre a Rede Globo, o Unicef e, agora, a Unesco. De forma ampla também da Igreja Católica no Brasil, através principalmente da pastoral da criança, e de um número grande de associações beneficiadas com o dinheiro obtido com as doações do público.

A vigésima edição do programa está em seu momento de capanha para a doação de recursos para o exercício de 2006, capanha que se iniciou no último final de semana e prossegue até o dia 20 de agosto. O programa de lançamento da campanha contou este ano com duas apresentações, uma sábado à noite e outra no domingo à tarde.

A diretoria comercial da emissora, que vende a publicidade para o programa de forma isolada, comemora que "em 2004 o resultado de audiência e share foi superior a somatória de toda a concorrência", uma vez que "os mais variados programas da TV Globo estarão envolvidos nas comemorações, do jornalismo à teledramaturgia, reforçando a campanha para superar o recorde de arrecadação ocorrido em 2004: R$ 16,1 milhões."

Sem dúvida o programa merece crédito, apesar do número limitado de crianças e adolescentes atendidos por estardalhaço de caráter nacional: são apenas três milhões atendidas por ano de um universo de cerca de 15 milhões com renda família inferior a 1/2 salário mínimo por pessoa, ao menos no aspecto mercadológico da solução.

Os números gerais espantam quem está acustumado com as finanças de pessoa física, mesmo aqueles com situação financeira confortável, mas o que mais impressiona é a habilidade para produzir resultados tão eficientes com tão poucos recursos, uma vez que se for dividido o total arrecadado em 2004 (16 mi) pelo total de crianças atendidas (3 mi), chega-se à proeza de transformar a realidade de uma criança com a módica quantia de cinco reais por um ano inteiro de atendimento.

A perversidade, no entanto, de se abordar o debate sobre o Criança Esperança, é equivalente a revelar à criança que o Papai Noel é apenas uma doce ilusão, boa para recordar dos tempos de infância, boa para se reviver com os filhos, que um dia atentam para a letra da música que cantam tão alegres: "eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel, com certeza já morreu, ou então, felicidade, é brinquedo que não tem", então o sonho se desfaz.

Para começar de leve basta comparar os recursos arrecadados com o programa (16 mi), de pessoas físicas e jurídicas do Brasil todo para causa tão "nobre" com a mais conservadora das estimativas de recursos aportados pelo capital privado e pelo capital estatal para a corrupção (dezenas de bilhões), não apenas no mensalão, como em outros esquemas em vigência apenas no exercício de 2005, que não é ano de eleição.

Tal constatação, no entanto, não deixa de representar também um alívio, afinal, apesar de bilhões de reais serem gastos anualmente com corrupção, ao menos uma pequena quantia transforma a vida de tantas crianças no Brasil, segundo o programa, ou seja, há esperança, como é necessário que exista.

O programa funciona como um serviço de venda de indulgências, onde o brasileiro de classe média pode comprar seu perdão por seu pecado quotidiano, composto, no mínimo, de omissão severa diária diante do sofrimento alheio, especificamente no caso do Criança Esperança de pessoas aceitas como inocentes.

Todo ano milhões de pessoas pagam uma pequena prestação de seu lugarzinho no céu, ao lado dos homens de boa vontade, e das mulheres também, claro. Desde que inventaram o Criança Esperança, há 20 anos, São Pedro precisa construir conjuntos habitacionais na periferia do paraíso. De tanta gente que chega lá com uma carta de crédito tão michuruca, só mesmo pré-moldado de nuvem para resolver.

À época da colonização eram os missionários jesuítas que vinham, com toda sua fé, com toda sua crença de estarem conduzindo os nativos do lugar que hoje se chama Brasil à salvação, adestrar os índios brasileiros, vivenciaram inúmeras privações para levar a cabo sua missão, embora desconhecessem qual realmente era.

Hoje, são milhares trabalhando nas ONG, associações sem fins lucrativos que reunem profissionais e amadores, remunerados ou não, empenhados na tarefa de salvar os trobriands, servindo à sociedade em disciplinar os potenciais marginais do sistema, em adestrar crianças e adolescentes para a moral do trabalho, para que não formem no futuro bandos perigosos vagando ociosos pelas cidades e destruindo a paz tão almejada, aquela que dos malvadinhos "pedindo a paz sem oferecer nada em troca."

O importante, ao final, é manter viva a esperança nas crianças, como em um conto de fadas que encontrou seu leitor depois de ser expurgado da biblioteca de um grande e tradicional colégio de Fortaleza (CE): "A fada compreendeu por que era importante, para os mágicos, os meninos terem esperança. A esperança é uma coisa que sempre espera e nada faz."

(...)

Acordou pela manhã, feliz como aluno em recreio, e saiu só, sem rumo, rua adiante. E ao primeiro menino ofereceu seus poderes.
- Não - disse o menino. - Quero aprender a ler e escrever na escola. Ontem - continuou ele - um colega aprendeu sozinho e foi levado pelos doutores para tratamento em hospital. Eles disseram que ele sabia mais do que devia. Não sei o que farão com ele. Talvez tome injeção de esquecimento. Com isso, fiquei com medo de saber.

(...)

De repente, uma voz de menina murmurou com medo:
- Eu quero uma cama para dormir. Sem cama não posso ter sonhos.
Os meninos calaram...
A fada, assustada, olhou no coração da menina e viu a esperança balançando.
Com gesto preciso, fez surgir, no centro da praça, uma cama de madeira polida e mais um colchão de algodão macio.
- É sua - disse a fada.
A menina, olhando de longe e com medo daquela verdade, respondeu:
- Não quero mais. Não tenho casa para guarda a cama.
A fada, sem vacilar, continuou seu trabalho, fazendo nascer, no meio da praça, uma casa, com janelas para os quatro cantos do mundo! E, dentro da casa, a cama.

(...)

No meio da brincadeira que os meninos viviam, foram aparecendo magicamente: o banqueiro, o industrial, o economista, o arquiteto, o deputado, o professor, o padre e o delegado.
Sem reparar na alegria dos meninos, o prefeito discursou:
- Senhores, a praça foi feita para o povo pensar a esperança. Não posso deixar esta casa plantada no meio dela. Como representante legitimo do povo, mandarei destruí-la.
O banqueiro perguntou ao industrial:
- Como a casa foi construida, se ninguém me pediu dinheiro emprestado?
O industrial respondeu:
- Seu material de construção não foi comprado na minha indústria. É contrabando.
O economista disse:
- Não fui consultado sobre os preços da construção.
O político discursou:
- Minha gente, eu não usei minhas Medidas Provisórias.
O arquiteto contou que não recebeu nenhuma encomenda do projeto e o professor lamentou a falta de cultura do povo.
O padre apenas rezou:
- Santo deus!
E o delegado, que tudo ouviu, apenas ordenou aos soldados:
- Prendam imediatamente a pessoa que desobedeceu à lei.

(...)

A fada compreendeu por que era importante, para os mágicos, os meninos terem esperança. A esperança é uma coisa que sempre espera e nada faz.

(...)

Maria foi levada para a sala de interrogatório. Assentou-se diante do delegado e ouviu a seguinte sentença:
- Fada não é nome nem sobrenome. Entrou na cidade sem passaporte, sem carteira de identidade, sem carteira profissional, sem título de eleitor, sem cartão de crédito e CPF. Não tem endereço de residência nem CEP e diz ter como profissão realizar desejos. Não é filiada a nenhum sindicato e ensinou menino a ler e escrever sem técnica de professor. Construiu casa sem empréstimo, avalista e projeto, em lugar proibido. Falou mal da esperança. Contou segredo no coração dos meninos. Sorriu no momento da prisão, desrespeitando as autoridades. Com certeza, não foi informada de que vivemos numa democracia. Por tudo, Maria do Céu é culpada e permanerá presa até que se prove em contrário.

(..)
QUEIRÓS, Bartolomeu Campos. Onde tem bruxa, tem fada...
Editora Moderna. São Paulo, SP. 1995. 76a. Edição.
Ilustração de Mario Cafiero.

28.7.05

Que rufem os tambores...

Inicie-se a publicação de textos de caráter e responsabilidade estritamente individual e de cada autor neste blog, com o objetivo de se iniciar o exercício de formação do corpo editorial da Esfera Pública.

Esfera Pública é o nome de uma revista em projeto, que avança em mais uma etapa. É preciso alertar que não se trata de um nome original, mas de uma apropriação da tradução possível e limitada do conceito de Habermas, intelectual contemporâneo, originalmente escrito como Öffentlichkeit, que de maneira simultaneamente simplória e simplista resume-se em um local de disputa entre princípios divergentes, de defesa dos interesses dos mais diversos atores.

A Esfera Pública de Habermas se constitui em instância de deliberação e legitimação do poder, é um espaço de mediação entre o campo das relações privadas e o Poder Público. Espaço independente do Estado, que tem como objetivo principal discutir racionalmnete questões de interesse privado que, por sua relevância, ganham conotação política.

A revista não se pretende a materialização do conceito de Esfera Pública, que jamais poderia ser resumido a uma revista. Apropriar-se do nome para este veículo é feito sob licença poética. Uma ousadia, uma utopia talvez.

Uma vez que o objetivo deste exercício é a convergência em uma revista, assim é importante que a prática tente convergir para isso, mas como é um exercício, então há flexibilidade maior que se fosse na revista em si, que já deve em si ser flexível, já que se pretende experimental.

Os textos aqui publicados o são para serem criticados, seja por colaboradores, seja por qualquer visitante que por aqui desemboque, oriundo de qualquer afluente. Os comentários devem ser dirigidos preferencialmente apenas ao texto, às idéias ou à estrutura do texto. Seja o texto em forma de prosa, poesia, ilustração, arte. Seja de gênero jornalístico, literário, artístico ou científico, categorias não ecludentes e nem suficientes.

Tem-se o objetivo de formar o corpo da revista, isso não significa que a revista será a soma de tudo que for aqui publicado, apenas o que aqui for publicado e permanecer sendo publicado servirá de baliza para compreender o que será a revista. Experimental não será aqui sinônimo de laissez-faire.

Então, caso perceba necessário e inevitável, neste momento provisório, eu atuarei com pesar de forma autoritária e representarei o papel de editor chefe deste veículo, pois arbitrariamente ainda não considero formado um coletivo suficiente para o seu feitio.

12.7.05

Lançamento Esfera Pública

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Fortaleza, 5 de julho de 2005

Carta aberta à comunidade,

Preliminarmente gostaria de destacar que sei que nem todos são do jornalismo, da publicidade ou tem interesse em artes ou comunicação, mas quem sou eu para decidir isso para cada um de vocês?

Sendo assim, envio para todos e peço que aqueles que se determinarem em recebimento indevido desta mensagem, apenas me avisem, e procurarei não mais os incluir nas mensagens referentes à Revista Esfera Pública.

Alguns colegas já estão por dentro, alguns mais que outros, de que estamos iniciando o projeto de uma revista experimental alternativa eletrônica semanal, que talvez durante a fase beta seja ainda mensal.

Alguns podem pensar que deveria ser segredo o lançamento de uma nova revista, mas não temos como trabalhar em segredo se queremos que seja um projeto participativo e plural. Eu gostaria de adicionar a palavra democrático ou libertário, mas não estou certo ainda de que seremos capazes de honrar tais conceitos em nossa praxis, desejo que sim, mas essa será certamente razão de grandes debates entre os colaboradores.

Vários colegas já se manifestaram interessados em colaborar das mais diversas formas e vamos precisar de todas essas colaborações. Precisaremos de jornalistas, de publicitários, de designers, de artistas, de cronistas, de articulistas, de amigos, de leitores e, bem, quem será capaz de determinar quanta colaboração será necessária?

Estou enviando esta mensagem com o objetivo de formar o coletivo de sustentação do projeto, desejo marcar uma primeira reunião com o máximo de interessados possível e para que isso se torne possível, peço que aqueles que tiverem interesse verdadeiro em participar do projeto Esfera Pública, que me enviem resposta com urgência.

Atenciosamente,

Leonardo Ruoso

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